sábado, 22 de fevereiro de 2020

Não nos conhecemos, mas nos contemplamos.

Eu já não sei dizer o que penso.
Se penso o que eu digo. 
Tampouco, digo o que eu penso. 
Nesses silêncios espero que ela entenda
tudo.
Das coisas que eu busco entender, 
mas não entendo e eu apenas sinto.
Não sei se vou, se fico, se rompo ou continuo.
Estou aqui em compasso de espera.
Aflito espero um pouco mais.
Quer ir embora? Quero que você vá? 
Desde que fique aqui. 

Ao retornar ao trabalho docente por vezes nós professores nos deparamos com frases assim como da epígrafe, (poeminha que fiz por compaixão dessa aflição dos meus alunos). Eles estão na escola, na faculdade, num tempo de espera, por outra formação, por colocação profissional, por mudança e esperança de vida. Dentre outras coisas tentam romper com antigos afetos, velhos amores, nessa ânsia por viver o desconhecido. Isso é uma parte do desenvolvimento, rupturas, continuidades, permanências.
Vivemos hoje uma época que exalta a rapidez, o fluído, efêmero e urgente, em um paradoxo sufocamos a juventude com tais expectativas, mas dizemos que o seu tempo é o agora. Cada um tem o seu tempo.
O livro, "Era do Cansaço," de Byung-chul Han, salienta que há um excesso de cobrança por positividade, produtividade e felicidade, deixando as pessoas mais deprimidas, improdutivas sobre o que realmente importa e infelizes, talvez, por uma desvalorização do tempo do ócio, que ele descreve como tempo de contemplação, silêncio e eu acrescento melancolia.
Justamente o tempo de ócio, do ócio produtivo é o tempo da juventude e o espaço é a escola. Na juventude e na escola temos a liberdade de experimentar e recusar, imaginar, contemplar e negar. Isso precisa ser ensinado na escola. Que há escolhas sobre o que fazer e o que deixar de fazer, além daquilo que é necessário fazer diante das próprias escolhas, por isso é preciso a contemplação e a imaginação.
Por exemplo, a escolha profissional, será que o jovem, o estudante, acredita que executando tais tarefas terá êxito? Irá fazer bem, bem feito, terá reconhecimento social- financeiro,  sobre aquilo que vai realizar?
Essas questões são importantes, elas vão além de divagações existências sobre o "quem sou eu?". Elas devem cumprir um vislumbre e contemplação sobre que vida eu desejo ter? Qual o meu papel social diante dos meus pares e do futuro da minha comunidade?
Na curta duração, devemos contemplar nosso dia, nele qual é a hora que  mais esperamos? O nosso tempo?
Na média duração, por exemplo, ao adentrarmos um curso, uma faculdade, percorremos esse caminho pois queremos chegar em qual lugar ou posição social? Estudamos para quê? Juntamos dinheiro para quê?
Na longa duração, que tipo de velho, de pai, de avô, de marido eu quero ser? O que vou deixar para os meus amados como segurança, esperança e exemplo? Terei a sorte de planejar minha morte?
Temos que nos contemplar diante do tempo.
Como professores devemos nos atentar para isso. Qual vida nossos alunos estão construindo e em que momento de vida eles se encontram?
A escola como um espaço de ensaio e de ócio deve se ocupar dos planos e desenvolvimentos de cada um. Chega dessa ideia de escola massificadora e formadora para empresas, indústrias e nações que já estão obsoletas.
Ao mesmo tempo que chega de deixarmos nossos alunos, nós mesmos, os jovens, perdidos num imediatismo, de decisões tomadas ao sabor de acontecimentos alheios aos nossos planos e desejos. Devemos ensinar nossos alunos a pensar, planejar executar, desistir, recomeçar para serem donos do próprio tempo e da própria vida.




quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

BOM SENSO


BOM SENSO
“Tente colocar bom senso na cabeça de um tolo e ele dirá que é tolice” (Eurípedes)
Bom senso é um conceito usado na argumentação que está estritamente ligado às noções de sabedoria e de razoabilidade, e que define a capacidade média que uma pessoa possui, ou deveria possuir, de adequar regras e costumes a determinadas realidades considerando as consequências, e, assim, poder fazer bons julgamentos e escolhas. Podendo, assim, ser definido como a forma de "filosofar" espontânea do homem comum, também chamada de "filosofia de vida", que supõe certa capacidade de organização, auto-controle e independência de quem analisa a experiência de vida cotidiana.
O bom senso é por vezes confundido com a ideia de senso comum, sendo, no entanto, muitas vezes o seu oposto. Ao passo que o senso comum pode refletir muitas vezes uma opinião por vezes errônea e preconceituosa sobre determinado objeto. O bom senso está ligado à ideia de sensatez, sendo uma capacidade intuitiva de distinguir a melhor conduta em situações específicas que, muitas vezes, são difíceis de serem analisadas mais longamente. Para Aristóteles, o bom senso é "elemento central da conduta ética. Uma capacidade virtuosa de achar o meio termo e distinguir a ação correta, o que é em termos mais simples, nada mais que bom senso."
bom senso vai muito além da capacidade de distinguir o certo do errado. O bom senso está diretamente ligado à capacidade intuitiva do ser humano de fazer a coisa certa. Ele é um elemento que está ligado à moral, de maneira que o bom senso praticado por um cristão, poderá ser interpretado de uma forma diferente por um islã ou judeu. Também reflete a cultura e o meio a qual o ser humano vive. O bom senso não envolve tanto uma reflexão aprofundada sobre um determinado tema, lugar ou situação (isso já entraria no campo da reflexão), mas sim a capacidade de agir e interagir, obedecendo certos parâmetros da normalidade, face uma situação qualquer, guiando-se por um senso comum e quase que completamente intuitivo.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

Criticar é para quem pode!?


A atitude crítica[i]




A primeira característica da atitude filosófica é negativa, isto é, um dizer não ao senso comum, aos pré-conceitos, aos pré-juízos, aos fatos e às idéias da experiência cotidiana, ao que “todo mundo diz e pensa”, ao estabelecido.
A segunda característica da atitude filosófica é positiva, isto é, uma interrogação sobre o que são as coisas, as idéias, os fatos, as situações, os comportamentos, os valores, nós mesmos. É também uma interrogação sobre o porquê disso tudo e de  nós, e uma interrogação sobre como tudo isso é assim e não de outra maneira. O que é? Por que é? Como é? Essas são as indagações fundamentais da atitude filosófica.
A face negativa e a face positiva da atitude filosófica constituem o que chamamos de atitude crítica e pensamento crítico. A Filosofia começa dizendo não às crenças e aos preconceitos do senso comum e, portanto, começa dizendo que não sabemos o que imaginávamos saber; por isso, o patrono da Filosofia, o grego Sócrates, afirmava que a primeira e fundamental verdade filosófica é dizer: “Sei que nada sei”. Para o discípulo de Sócrates, o filósofo grego Platão, a Filosofia começa com a admiração; já o  discípulo de Platão, o filósofo Aristóteles, acreditava que a Filosofia começa com o espanto.
Admiração e espanto significam: tomamos distância do nosso mundo costumeiro, através de nosso pensamento, olhando-o como se nunca o tivéssemos visto antes, como se não tivéssemos tido família, amigos, professores, livros e outros meios de comunicação que nos tivessem dito o que o mundo é; como se estivéssemos acabando de nascer para o mundo e para nós mesmos e precisássemos perguntar o que é, por que é e como é o mundo, e precisássemos perguntar também o que somos, por que somos e como somos.

Para que Filosofia?
Ora, muitos fazem uma outra pergunta: afinal, para que Filosofia? É uma pergunta interessante. Não vemos nem ouvimos ninguém perguntar, por exemplo, para que matemática ou física? Para que geografia ou geologia? Para que história ou sociologia? Para que biologia ou psicologia? Para que astronomia ou química? Para que pintura, literatura, música ou dança? Mas todo mundo acha muito natural perguntar: Para que Filosofia?
Em geral, essa pergunta costuma receber uma resposta irônica, conhecida dos estudantes de Filosofia: “A Filosofia é uma ciência com a qual e sem a qual o mundo permanece tal e qual”. Ou seja, a Filosofia não serve para nada. Por isso, se costuma chamar de “filósofo” alguém sempre distraído, com a cabeça no mundo da lua, pensando e dizendo coisas que ninguém entende e que são perfeitamente inúteis. Essa pergunta, “Para que Filosofia?”, tem a sua razão de ser.
Em nossa cultura e em nossa sociedade, costumamos considerar que alguma  coisa só tem o direito de existir se tiver alguma finalidade prática, muito visível e de utilidade imediata. Por isso, ninguém pergunta para que as ciências, pois todo mundo imagina ver a utilidade das ciências nos produtos da técnica, isto é, na aplicação científica à realidade.
Todo mundo também imagina ver a utilidade das artes, tanto por causa da compra e venda das obras de arte, quanto porque nossa cultura vê os artistas como gênios que merecem ser valorizados para o elogio da humanidade.
Ninguém, todavia, consegue ver para que serviria a Filosofia, donde dizer-se: não serve para coisa alguma. Parece, porém, que o senso comum não enxerga algo que os cientistas sabem muito bem. As ciências pretendem ser conhecimentos verdadeiros, obtidos graças a procedimentos rigorosos de pensamento; pretendem agir sobre a realidade, através de instrumentos e objetos técnicos; pretendem fazer progressos nos conhecimentos, corrigindo-os e aumentando-os.
Ora, todas essas pretensões das ciências pressupõem que elas acreditam na existência da verdade, de procedimentos corretos para bem usar o pensamento, na tecnologia como aplicação prática de teorias, na racionalidade dos conhecimentos, porque podem ser corrigidos e aperfeiçoados.
Verdade, pensamento, procedimentos especiais para conhecer fatos, relação entre teoria e prática, correção e acúmulo de saberes: tudo isso não é ciência, são questões filosóficas. O cientista parte delas como questões já respondidas, mas é a Filosofia quem as formula e busca respostas para elas.
Assim, o trabalho das ciências pressupõe, como condição, o trabalho da Filosofia, mesmo que o cientista não seja filósofo.

Atitude filosófica: indagar

Se, portanto, deixarmos de lado, por enquanto, os objetos com os quais a Filosofia se ocupa, veremos que a atitude filosófica possui algumas características que são as mesmas, independentemente do conteúdo investigado.
Essas características são:
- perguntar o que a coisa, ou o valor, ou a idéia, é. A Filosofia pergunta qual é a realidade ou natureza e qual é a significação de alguma coisa, não importa qual;
- perguntar como a coisa, a idéia ou o valor, é. A Filosofia indaga qual é a estrutura e quais são as relações que constituem uma coisa, uma idéia ou um valor;
- perguntar por que a coisa, a idéia ou o valor, existe e é como é. A Filosofia pergunta pela origem ou pela causa de uma coisa, de uma idéia, de um valor.
A atitude filosófica inicia-se dirigindo essas indagações ao mundo que nos rodeia e às relações que mantemos com ele. Pouco a pouco, porém, descobre que essas questões se referem, afinal, à nossa capacidade de conhecer, à nossa capacidade de pensar.

A reflexão filosófica

A reflexão filosófica organiza-se em torno de três grandes conjuntos de perguntas ou questões:
1. Por que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos e fazemos o que fazemos? Isto é, quais os motivos, as razões e as causas para pensarmos o que pensamos, dizermos o que dizemos, fazermos o que fazemos?
2. O que queremos pensar quando pensamos, o que queremos dizer quando falamos, o que queremos fazer quando agimos? Isto é, qual é o conteúdo ou o sentido do que pensamos, dizemos ou fazemos?
3. Para que pensamos o que pensamos, dizemos o que dizemos, fazemos o que fazemos? Isto é, qual é a intenção ou a finalidade do que pensamos, dizemos e fazemos?

Essas três questões podem ser resumidas em: O que é pensar, falar e agir? E elas  pressupõem a seguinte pergunta: Nossas crenças cotidianas são ou não um saber verdadeiro, um conhecimento?
Como vimos, a atitude filosófica inicia-se indagando: O que é? Como é? Por que é?, dirigindo-se ao mundo que nos rodeia e aos seres humanos que nele vivem e com ele se relacionam. São perguntas sobre a essência, a significação ou a estrutura e a origem de todas as coisas.



[i] CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo. Àtica. 2000. p.8.