Fonte: |
Rafael dos Santos Borges.
Olímpia-SP, 15 de maio de 2020.
Nesses tempos em que estamos realizando um afastamento social, a tecnologia computacional e informacional é uma tábua de salvação para muitos trabalhadores, empresários e governos, mas para parcelas consideráveis elas são um obstáculo para mais. Os excluídos por razões sociais, que vai desde o morador de rua, passando por analfabetos, que já são várias vezes excluídos, afastam-se ainda mais da sociedade e soma-se agora novos excluídos:
- Pessoas que não têm habilidade com a tecnologia, que devem acessar aplicativos, preencher formulários pelo celular. Urgem então esses excluídos, que conseguiam contornar seus problemas de outras maneiras não tecnológicas computacionais. Ilustrando - como um dono de pequeno negócio, que não era um excluído social, poderia contar com um bom fluxo financeiro, tinha autonomia, mas agora não consegue acessar seus clientes e muito menos os protocolos burocráticos e tecnológicos dos auxílios governamentais e dos sistemas financeiros. Morre assim um negócio, um empresário, uma fertilidade econômica e nasce um excluído social, para quem fertilizará doenças psiquiatras, em virtude do não reconhecimento do seu papel e da frustração de sentir que esse tempo e lugar não é mais dele.
- Pessoas que têm habilidade, mas não têm disponíveis tecnologias computacionais robustas, ágeis, acessíveis, atuais, por exemplo, os nativos digitais, mas que não tem a tenologia ao seu dispor (falta de conexão com a internet) e não tem a tecnologia atual necessária (aparelhos obsoletos). Ilustrando - como o garoto que está nas redes sociais, tem celular herdado da mãe, ou do irmão mais velho, ou tem até um computador, igualmente herdado, pois quem doou sentia que aquele aparelho tinha defasagem tecnológica, nesse caso a marginalidade é sentida de forma bruta, pois a sua condição social é escancarada pela acesso precário as tecnologias legitimadora do melhor status social. Um bom aluno, entusiasta da inovação tecnológica, vê em sua paixão e até vocação, as marcas de exclusão, que podem até levar ao desejo de superação (numa visão romântica), mas deixa o garoto passos para trás, e potencialmente ele se resignará na sua exclusão.
- Governos, que de fato são as Escolas, as Unidades Básicas de Saúde, as Unidades de Pronto Atendimento, o Programa de Saúde Familiar, o Sistema Único de Assistência Social, o Sistema Único de Saúde, as Policias precisam agora de tecnologias e infra-estrutura que a sociedade brasileira optou por deliberadamente abandonar. Os administradores dessas instituições além de não contar com o recurso, são cobrados justamente por aquilo que lhes foi negado. Os dados sobre a pandemia precisam de informação, porém as formas de coleta de dados, das informações sobre a demanda real da sociedade e as condições de acolhimento foram sucateados e os governos estão trabalhando às cegas. Ilustrando - Como se pode saber dos doentes em suas casas, se junto com os médicos cubanos, também excluí-se a viabilidade dos Programas de Saúde da Família? Como podemos saber da violência doméstica se as Bases das Policias Comunitárias foram preteridas por Batalhões de Polícia? Como contar com inteligência fiscal, tributária se a Polícia Civil Investigativa e os Fiscais são deficientes em número? Como as Escolas vão saber das carências dos seus alunos se escola de atenção integral nem foi implementada? Esses órgãos não contam com redes de internet e equipamentos em bom número, mas quando contam, não contam com redes de informação, pois a sociedade brasileira preferiu governos fortes em centralização, mas fraco em serviços.
Justamente as tecnologias da informação e da computação poderiam ser instrumentos de inclusão. Não deveria haver prevalência de uma tecnologia por outra. Além de um aplicativo, poderia haver atendimento telefônico, cartões com crédito, cheques do governo, sistema de cartas e envio de atividades, agentes de saúde locais, por fim, não deveria haver a imposição de uma única forma de tecnologia informacional, pois isso assevera e inova as formas de exclusão social. Ilustrando a tecnologia que excluí - o aplicativo de auxílio emergencial. Ilustrando uma tecnologia que incluí - a Plataforma Data SUS e os usos de coletivos urbanos de aplicativos e plataformas de redes de auxílio mútuo.
Sugestão de leitura:
FREITAS, Carlos Cesar Garcia; SEGATTO, Andrea Paula. Ciência, tecnologia e sociedade pelo olhar da Tecnologia Social: um estudo a partir da Teoria Crítica da Tecnologia. Cad. EBAPE.BR, Rio de Janeiro , v. 12, n. 2, p. 302-320, June 2014 . Available from <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-39512014000200009&lng=en&nrm=iso>. access on 15 May 2020. https://doi.org/10.1590/1679-39517420.
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